terça-feira, 24 de novembro de 2015

E NÃO É PARA REVOLTAR?

Todos nós, quando nascemos, recebemos algumas missões especiais, sejam elas divinas ou humanas, conforme a crença de cada um. Dentre elas estão a perpetuação da espécie e, um pouco menos importante, a continuidade do nome da família.
Ao assumirmos essa missão, fazemos tudo o que podemos e até o que não podemos, para proporcionar aos nossos filhos uma condição que os deixem em situação melhor que a nossa, em todos os aspectos.
Difícil não encontrar pedras no caminho e, na maioria das vezes, não temos controle algum da situação.
No mês de abril, minha filha saiu para um passeio de bicicleta com seu noivo. Saíram pela ciclofaixa tranquilamente quando, a certa altura, perdeu o equilíbrio e caiu, batendo com o joelho no chão. Como a dor que sentia não era apenas das escoriações, foi ao pronto socorro, onde o médico ortopedista diagnosticou uma pancada forte, sem maiores consequências e que, no máximo trinta dias estaria novinha em folha. Passada uma semana, a dor só aumentara e fomos ao pronto socorro do bairro, onde a médica clínica geral pediu outros exames, que verificamos a grande demora para fazê-los pelo sistema público de saúde.
Fizemos esse exame em uma clínica particular, onde descobriu o rompimento do menisco e uma suspeita de rompimento de ligamentos..
Em um hospital particular foi feita a cirurgia do menisco e verificou a preservação dos ligamentos. E aí começaram as grandes batalhas.
Não nos foi recomendado o imediato inicio da fisioterapia, apenas repouso até o retorno. Com isso, surgiu uma fibrose, fazendo com que sua perna não dobrasse. O médico reconhecendo o seu equívoco, sugeriu um procedimento em cento cirúrgico, que era a dobra da perna por meio de anestesia geral. Logicamente, ele nada cobrou por isso, mas tivemos que arcar com as despesas hospitalares e do médico anestesista.
Esse procedimento só piorou, já que a perna que anteriormente não dobrava, passou também a não esticar totalmente.
Desde então, pela limitação dos movimentos provocados pelas terríveis dores, começamos uma turnê por fisioterapias, hidroterapias, anestesiologistas, remedinhos, remédios, remediões, orações, simpatias, $$$$$$$$$$$$$$$$$$$...
E ainda hoje continuamos na luta, diariamente, por uma coisa que, segundo um especialista, nem de cirurgia precisaria se tivéssemos ido até ele nos primeiros dias após a queda.
Aí, a gente fica pensando: você procura soluções na saúde pública e não encontra; tenta na privada e a coisa também não funciona.
No final das contas, a gente fica revoltado com tanto descaso, seja público ou privado, com a falta de humanismo, dedicação e zelo por quem está fragilizado por certa situação.
E aqui eu paro, porque os palavrões já estão chegando na ponta da língua.

AGRICIO BRASILINO

quarta-feira, 8 de julho de 2015

POLÍTICA X POLÍTICA = IGUAL

O maniqueísmo das novelas da Globo e dos livros de José de Alencar tomou vida e contaminou todo o Brasil.
O bom senso morreu e ninguém compareceu a seu sepultamento.
Residimos pois num país dividido por uma (ainda) imaginária cerca eletrificada.
De um lado permanecem os “de bem”, que são 300% contra Dilma e o PT; culpam Lula, Dilma e o partido dos trabalhadores por tudo: crise mundial, vitória do “não” na Grécia, fila no banco e doença do cãozinho; vociferam por um golpe – que nunca acontecerá – e creem piamente que a corrupção não é um traço social, mas petista. E se aliam a qualquer esgoto humano se sua chapa for dizimar o PT.
Do outro lado estão os “do bem”, que são 300% a favor de Dilma e do PT; lutam pela canonização de Lula junto ao Vaticano, isentam Dilma e o PT de qualquer problema ou atitude atrapalhada sempre colocando a conta dos erros na “governabilidade”; defendem o país de um golpe – que nunca acontecerá –, comparam até o tamanho dos passos de Dilma com os de FHC e defenestram a mídia golpista, mas não hesitam em conceder perdões imediatos a todo reacionário que numa frase fortuita se coloque a favor do governo.
Além destas duas facções e andando encima da cerca há 1% dos habitantes do país, equilibrando-se na busca da sensatez – seja com posições à esquerda de Dilma (como é meu caso) ou à direita dela – sempre com educação, respeito às instituições e sem paixões cegas que geram indignação seletiva.
Mas tranquilizemos coxinhas e petralhas: ninguém nos escuta mesmo daqui de cima; podem seguir bradando louvores de guerra santa e achando que a solução do mundo é jogar gás mostarda no cachorro quente do pessoal do outro lado da cerca.
Prometemos não atrapalhar.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Restrição Hídrica?

Represa de Jaguarí, em Jacareí.
É esquisita a situação de quem como eu mora no litoral.
Se por um lado, andando alguns metros, encontro literalmente um mar de água (salgada, mas água), nas rádios e redes regionais de televisão daqui e com certeza do Brasil todo, outro assunto não repercute tanto como a crise que vemos no abastecimento de água e, consequentemente, no abastecimento de energia.
Muito se tem dito por técnicos, curiosos, políticos, consumidores; análises parcialmente e interessadamente colocadas, aumentando a confusão na maioria das vezes.
Mas esse artigo, repassado por um amigo, explica muito bem,por todos os ângulos, o que passamos atualmente e o que poderemos passar no futuro, se todos os interessados realmente descruzar os braços e agir efetivamente na busca de soluções de curto, médio e longo prazo.
Ruínas da cidade de Igaratá aparecendo com a longa estiagem.
O título do artigo é "10 Mitos sobre a crise hídrica" e diz o seguinte
1- “Não choveu e por isso está faltando água”. Essa conclusão é cientificamente problemática. Existem períodos chuvosos e de estiagem, descritos estatisticamente. É natural que isso ocorra. A base de dados de São Paulo possibilita análises precisas desde o século XIX e projeções anteriores a partir de cálculos matemáticos. Um sistema de abastecimento eficiente precisa ser projetado seguindo essas previsões (ex: estiagens que ocorram a cada cem anos).
2- “É por causa do aquecimento global”. Existem poucos estudos verdadeiramente confiáveis em São Paulo. De qualquer forma, o problema aqui parece ser de escala de grandeza. A não ser que estejamos realmente vivendo uma catástrofe global repentina (que não parece ser o caso esse ano), a mudança nos padrões de chuva não atingem porcentagens tão grandes capazes de secar vários reservatórios de um ano para o outro. Mais estudadas são as mudanças climáticas locais por causa de ocupação urbana desordenada. Isso é concreto e pode trazer mudanças radicais. Aqui o problema é outro: as represas do sistema Cantareira estão longe demais do núcleo urbano adensado de SP para sentir efeitos como de ilha de calor. A escala do território é muito maior.
3- “Não choveu nas Represas”. Isso é uma simplificação grosseira. O volume do reservatório depende de vários fluxos, incluindo a chuva sobre o espelho d’água das represas. A chuva em regiões de cabeceira, por exemplo, pode recarregar o lençol freático e assim aumentar o volume de água dos rios. O processo é muito mais complexo.
4- “As próximas chuvas farão que o sistema volte ao normal”. Isso já é mais difícil de prever, mas tudo indica que a recuperação pode levar décadas. Como sabemos, quando o fundo do lago fica exposto (e seco), ele se torna permeável. Assim a água que voltar atingir esses lugares percola (infiltra) para o lençol freático, antes de criar uma camada impermeável. Se eu fosse usar minha intuição e conhecimento, diria que São Paulo tem duas opções a curto-médio prazo: (a) usar fontes alternativas de abastecimento antes que possa voltar a contar com as represas; (b) ter uma redução drástica em sua economia para que haja diminuição de consumo (há relação direta entre movimento econômico e consumo de água).
5- “Não existe outras fontes de abastecimento que não as represas atuais”. Essa afirmação é duplamente mentirosa. Primeiro porque sempre se pode construir represas em lugares mais e mais distantes (sobretudo em um país com esse recurso abundante como o Brasil) e transportar a água por bombeamento. O problema parece ser de ordem econômica já como o custo da água bombeada de longe sairia muito caro. Outra mentira é que não podemos usar água subterrânea. Não consigo entender o impedimento técnico disso. O Estado de São Paulo tem ampla reserva de água subterrânea (como o chamado aquífero Guarani), de onde é possível tirar água, sobretudo em momentos de crise. Novamente, o problema é custo de trazer essa água de longe que afetaria os lucros da Sabesp.
6- “O aquífero Guaraní é um reservatório subterrâneo”. A ideia de que o aquífero é um bolsão d’água, como um vazio preenchido pelo líquido, é ridiculamente equivocada. Não existe bolsão, em nenhum lugar no mundo. O aquífero é simplesmente água subterrânea diluída no solo. O aquífero Guaraní, nem é mesmo um só, mas descontínuo. Como uma camada profunda do lençol freático. Em todo caso, países como a Holanda acham o uso dessas águas tão bom que parte da produção superficial (reservatórios etc) é reinserida no solo e retirada novamente (!). Isso porque as propriedades químicas do líquido são, potencialmente, excelentes.
7- “Precisamos economizar água”. Outra simplificação. Os grandes consumidores (indústrias ou grandes estabelecimentos, por exemplo) e a perda de água por falta de manutenção do sistema representam os maiores gastos. Infelizmente os números oficiais parecem camuflados. A seguinte conta nunca fecha: consumo total = esgoto total + perda + água gasta em irrigação. Estima-se que as perdas estejam entre 30% e 40%. Ou seja, essa quantidade vaza na tubulação antes de atingir os consumidores. Água tratada e perdida. Para usar novamente o exemplo Holandês (que estudei), lá essas perdas são virtualmente 0%. Os índices elevados não são normais e são resultados de décadas de maximização de lucros da Sabesp ao custo de uma manutenção precária da rede.
8- “Não há racionamento”. O governo está fazendo a mídia e a população de boba. Em lugares pobres o racionamento já acontece há meses, dia sim, dia não (ou mesmo todo dia). É interessante notar que, historicamente, as populações pobres são as que sempre sentem mais esses efeitos (cito, por exemplo, as constantes interrupções no fornecimento de água no começo do século XX nos bairros operários das várzeas, como o Pari). A história se repete.
9- “É necessário implantar o racionamento”. Essa afirmação é bem perigosa porque coloca vidas em risco. Já como praticamente todas as construções na cidade têm grandes caixas d’água, o racionamento apenas ataca o problema das perdas da rede (vazamentos). É tudo que a Sabesp quer: em momentos de crise fazer racionamento e reduzir as perdas; sem diminuição de consumo, sem aumentar o controle de vazamentos. O custo disso? A saúde pública. A mesma trinca por onde a água vaza, se não houver pressão dentro do cano, se transformará em um ponto de entrada de poluentes do lençol freático nojento da cidade. Estaremos bebendo, sem saber água poluída, porque a poluição entrou pela rede urbana. Por isso que agências de saúde internacionais exigem pressão mínima dentro dos canos de abastecimento.
10- “Precisamos confiar na Sabesp nesse momento”. A Sabesp é gerida para maximizar lucros dos acionistas. Não está preocupada, em essência, em entregar um serviço de qualidade (exemplos são vários: a negligência no saneamento que polui o Rio Tietê, o uso de tecnologia obsoleta de tratamento de água com doses cavalares de cloro e, além, da crise no abastecimento decorrente dos pequenos investimentos no aumento do sistema de captação). A Sabesp é apenas herdeira de um sistema que já teve várias outras concessionárias: Cantareira Águas e Esgotos, RAE, SAEC etc. A empresa tem hoje uma concessão de abastecimento e saneamento. Acredito que é o momento de discutir a cassação dessa outorga, uma vez que as obrigações não foram cumpridas. Além, é claro, de uma nova administração no Governo do Estado, ao menos preocupada em entregar serviços público e não lucros para meia dúzia apenas.
Enfim, se eu pudesse resumir minhas conclusões: a crise no abastecimento não é natural, mas sim resultado de uma gestão voltada para a maximização de lucros da concessionária e de um Governo incompetente. Simples assim, ou talvez, infelizmente, nem tanto.

Gabriel Kogan é arquiteto e jornalista, formado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP; desenvolveu mestrado em Gerenciamento Hídrico no UNESCO-IHE (Holanda), onde pesquisou as origens históricas das enchentes em São Paulo. (Fonte)